DES(ACORDO)



"E também as memórias gloriosas
Daqueles Reis, que foram dilatando
A Fé, o Império, e as terras viciosas
De África e de Ásia andaram devastando;
E aqueles, que por obras valerosas
Se vão da lei da morte libertando;
Cantando espalharei por toda parte,
Se a tanto me ajudar o engenho e arte".

Luís Vaz de Camões


Deambulando pela rua após uma chuvada descomunalmente africana, estacionei as minhas pernas perante a vidraça do Instituto Camões. Ao tentar aperceber-me da cultura que por estas bandas andava em vigor, deparei-me com o Novo Acordo Ortográfico Português.

Devo dizer que analisei atentamente aquela informação recente e tentei compreender o porquê de tal mudança. Não consegui, ou melhor, desconsegui (à moda moçambicana)!

- De 23 passamos a 26 letras no nosso alfabeto. 
Assim já podemos dar aos nossos filhos todos os nomes estranhamente estrangeiros (de que os brasileiros tanto gostam!) e inserir na nossa linguagem aquelas palavras "difíceis e sonantes" que fazem com que o nosso discurso fique muito mais "chique" e muito menos entendível! E as abreviaturas como km ou kg, deliciam-se ao poder ser inscritas juntamente com as palavras da língua de Camões! Promovidas foram!

- Com minúsculas e maiúsculas, podemos dançar o Vira! (será que esta dança leva maiúscula?)
Os dias da semana desceram de categoria bem como os meses do ano e os pontos que sempre guiaram a nossa orientação. Voltam a ganhar as abreviaturas das designações das regiões, como Sul. O "N" e o "S" da bússola passam a liderar a escrita igualmente com maiúsculas.
Mas aqui, há direito de escolha! Podemos tratar os livros, as disciplinas, os professores, as pessoas e os monumentos consoante a nossa consideração. "Exmo Sr" ou "exmo sr" vai depender do nosso estado de espírito! É à vontade do freguês e o respeito, é só se apetecer!

- As mudas, morrem de vez. Mas atenção, há mudas que não se calam.
"Os atores entram em ação com convicção num grande espetáculo. O publico convicto entra em fricção e a reação é a esperada".
Gostaram? Se já era difícil decorar os "cc", os "ct", os "pt", etc.,  agora com tanta excepção... (será sem "p"? Se não se lê não se escreve....pois é!).


- Acentos para quê? 
As palavras homógrafas riem-se da confusão instalada.
"Os acentos não se leem e agora não se veem. Este ato heroico para a acentuação e malta, deem as boas vindas aos erros!" Já agora, "homógrafas" podia perder o acento!

- Os tracinhos também já eram.
Os anti, os auto, os micro, os ultras, os extra, os mini estão condenados ao matrimónio. Por outro lado o verbo "Haver" (que também se poderia escrever sem "h"!) divorcia-se dos "de". Se este verbo já era dos mais maltratados a nível oral, agora então vai ser insultado!
Mas, se por acaso os divorciados começarem pela mesma vogal, então aí voltam a jurar amor eterno e lá vem o tracinho, ou mais formal, o hífen. Exemplo: micro-ondas.
Porquê manter o "h" e o acento de "hífen"?

E finalmente temos a grande razão e a grande motivação para alguém ter estado horas a congeminar neste acordo; simplesmente para os brasileiros e restante CPLP não se sentirem alienados da língua que os educou.
"As amídalas estavam com mau aspeto. O fato era crônico. O médico foi perentório; operação urgente. O cômico da situação é que nem com anistia me salvava da faca!"


Desculpem-me os brasileiros e restante CPLP, mas não posso concordar com este acordo. Não acho que tenhamos de ser nós a reaprender a escrever a língua que vos foi ensinada.  Como nós aprendemos que "pingolim" são matraquilhos, que "açougue" é talho e "train" é comboio entre outras, vocês também conseguem compreender os nossos termos. Ou não? São milhões os que falam a nossa língua e conquistados por ela foram. Para continuarmos unidos não necessitamos de nos subjugar aos dialectos dos outros e capar a língua mãe.

E o que diria o nosso grande Luís Vaz de Camões se rescrevesse os dez cantos e as 1102 estrofes dos Lusíadas à luz deste acordo? Seguramente cegaria do outro olho com tamanha parvoeira. Uma coisa é certa; eu escreverei sempre na língua de Camões e não na língua de Dilma.


Portugal necessita de muitas reformas, mas Língua, Bandeira e Hino são sagrados.

CSD

Comentários

  1. Antigamente dizia-se que o brasileiro era o português com sotaque. E agora?

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  2. E agora é o português que tem de por sotaque para o brasileiro entender.

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  3. Concordo em absoluto.
    Escrevo e escreverei na língua de Camões hoje e sempre!
    Quando o computador assinalar erro, voltarei a corrigir para a escrita que aprendi já lá vão 40 anos.

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  4. Como te entendo tão bem...
    Beijinhos

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